domingo, 20 de maio de 2018

O treinador, a cultura e o idioma: A aventura brasileira na Terra da Rainha


A grande valorização dos treinadores e o insucesso tupiniquim em terras europeias. 
Por Gustavo Forapani
Os clubes de futebol têm se tornado organizações cada vez mais valiosas

       Quando falamos em organizações, logo nos vêm à cabeça a imagem de grandes empresas, corporações e multinacionais que habitam o imaginário comum da população, entretanto uma forma organizacional que foi sistematizada no século XX e tem ganhado força incrível desde o início dos anos 2000, - não é muito recordada enquanto organização -, são as organizações ligadas ao esporte. Atualmente, as grandes instituições esportivas surgem como organizações fortíssimas e verdadeiras máquinas lucrativas, principalmente as instituições iniciadas nos EUA e na Europa que surgem como organizações fortíssimas por todo o planeta.

Portanto, como todas as organizações mundiais, as relacionadas ao esporte possuem estrutura definida com relação à cargos, processos de tomada de decisão, entre outro. Partindo de uma hierarquia verticalizada, as organizações esportivas são divididas em cargos como proprietário, presidente, conselho, diretoria, comissão técnica, atletas, entre outros. Todos esses cargos possuem sua importância em maior ou menor escala, e, abordando especificamente o futebol, pode-se perceber que nos últimos anos um dos cargos tem ganhado bastante notoriedade e importância, é o cargo de treinador. Antes pouco importante e responsável apenas por “colocar os jogadores em campo”, hoje os treinadores recebem salários astronômicos e são tratados diversas vezes como estrelas em detrimento aos demais jogadores, sofrem grande pressão e estão quase sempre a mercê dos resultados.       

Mas, qual o motivo dessa valorização recente dos treinadores? Um dos pontos que pode ajudar explicar isso, está diretamente ligado à globalização constante, pois é cada vez mais comum vermos atletas de diferentes nacionalidades atuando juntos em determinado país, portanto o treinador precisa além de armar sua equipe, criar meios que possibilitem que pessoas tão diferentes trabalhem juntas sem criar atritos excessivos. Na Europa e na antiga América Espanhola, é comum a atuação de profissionais desta área em outros países, a língua comum e a proximidade geográfica entre os países em cada uma dessas regiões facilitam a adaptação do profissional ao local e seu melhor desempenho.     

Já, ao abordar o Brasil, não se percebe o mesmo sucesso dos treinadores em diversas partes do mundo, em partes pelo atraso técnico que eles possuem, mas também pela dificuldade de adaptação ao novo local de trabalho, pois apesar de muitos treinadores brasileiros serem limitados, há uma minoria competente e com trabalhos reconhecidos no país que acabaram falhando em solo estrangeiro.

Dois casos famosos de brasileiros que fracassaram em clubes europeus são Vanderlei Luxemburgo em sua passagem por Madrid e Luiz Felipe Scolari (Felipão) em Londres. O primeiro chegou com status de penta campeão brasileiro para dirigir o Real Madrid e não conseguiu ser campeão nacional pelo clube merengue, acusado de favorecer brasileiros do elenco em detrimento ao resto do time foi dispensado logo ao fim da sua primeira temporada pela equipe da capital. Se a campanha não foi brilhante, também não foi desastrosa: o técnico garantiu um honroso vice-campeonato espanhol.

Scolari à beira do gramado em um de seus jogos em sua péssima passagem por Londres

O grande fracasso brasileiro na Europa foi o de Scolari no Chelsea, o treinador brasileiro durou apenas quatro meses e seu fracasso foge do campo técnico e pode ser entendido também como uma falha na administração do elenco: responsável por administrar um dos grupos de atletas mais heterogêneos do mundo, - europeus, americanos, africanos e outros -, o técnico brasileiro foi “fritado” pelas principais estrelas da equipe e os jornais o acusaram de não saber lidar com o idioma do país. Partindo de uma lógica pós-modernista pode-se afirmar que não saber o idioma inglês foi uma barreira importante, mas o grande problema foi não entender a cultura do país e de seu grupo de atletas. O não entendimento do idioma foi uma conseqüência apenas. O treinador errou ao entender o clube como algo lógico e previsível igual a qualquer outro clube brasileiro, ou seja, ignorou a premissa do Homem enquanto imprevisível e não se preocupou em entender a cultura londrina e a cultura específica do time.

No próprio Brasil podemos ver algumas diferenças culturais que muitas vezes atrasam a adaptação de atletas e treinadores à diferentes locais, portanto deve-se partir da ideia do interpretativismo enquanto forma de integração cultural, para o profissional se adaptar à outra região geográfica ele deve entender a cultura e seus detalhes particulares, uma ideia interessante poderia ser adaptação ao local antes do início do trabalho, mas nesse mundo “acelerado” a experiência e o aprendizado devem ser ao mesmo tempo em que o trabalho é realizado. 

Como diz Humberto Gessinger em uma de suas músicas, “não há tempo perdido, não há tempo à perder”, ou seja, as missões inglórias dos brasileiros no exterior devem ser consideradas enquanto aprendizagem em um sistema de circuito duplo a fim de que os mesmos erros não sejam cometidos pelos brasileiros ou por qualquer outro povo e todos conquistem seu lugar ao sol, valorizando a diversidade, mas sempre contribuindo com suas particularidades culturais.
           

← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário